No século passado, acreditava-se que o útero fosse uma cápsula acusticamente isolada do mundo. Foi só na década de 70, que experimentos realizados com microfones colocados no interior do corpo de gestantes revelaram que os sons chegam até o bebê. Desde então, as pesquisas e os instrumentos se aperfeiçoaram e, na década de 90, surgiram experimentos com hidrofones, que são microfones que funcionam em meio líquido. A conclusão desses estudos foi: apesar de atenuados pela gordura e pelos tecidos da mãe, os sons das conversas são, sim, ouvidos pelo bebê. Segundo Brezinca et al. (1997), o ambiente intra-uterino é repleto de sons maternos. Além da voz, o bebê ouve o batimento cardíaco, a respiração e sons causados por movimentos corporais, como por exemplo, sons vindos do intestino. A voz da mãe é, portanto, a voz ouvida com mais intensidade pelo bebê, devido às vibrações sonoras mais próximas. Portanto, apesar de as vozes “exteriores”, ou seja, de outras pessoas, serem também ouvidas, a voz materna tem a função mais especial.
Mas algo ainda mais interessante acontece. Os bebês não só ouvem, como desenvolvem memória dos sons intra-uterinos (Verri, 1999). Apesar das habilidades cognitivas não estarem totalmente desenvolvidas, ocorrem registros dos sons e isso terá, claro, consequências super interessantes: depois do nascimento, o bebê reconhecerá a voz da mãe, reconhecerá fonemas da(s) língua(s) que ouviu enquanto estava na barriga e as músicas que foram cantadas ou tocadas para ele serão, sim, reconhecidas. Então, ao conversar e cantar para o bebê na barriga, você está habituando-o ao ritmo e à musicalidade da sua língua. Lindo, não?
Isso tudo fica ainda mais especial, quando a gente descobre que não são apenas sons que são liberados quando a mamãe e o bebê, ainda na barriga, ouvem música. Ao escutar e/ou cantar uma música que nos agrada, nosso corpo produz hormônios de bem-estar. Pelo cordão umbilical, os hormônios presentes na nossa corrente sanguínea chegam ao bebê que, portanto, também vai se beneficiar dessa sensação. É por isso que, mais importante do que tocar música clássica para seu bebê na barriga – só porque você ouviu falar que pode ser bom – é ouvir músicas que você gosta, que te façam feliz, que te façam relaxar ou te façam querer dançar. Se você não gostar do estilo de música, é claro que a atividade não vai ser prazerosa e, consequentemente, os hormônios não serão produzidos.
Por outro lado, ouvir e/ou cantar músicas que te fazem bem vão alegrar seu bebê também. E mais: ele vai reconhecê-las quando estiver do lado de cá. Portanto, traga a música para a sua gravidez! E, se transmitir o português para seu filho é um desejo seu, não deixe essa oportunidade passar: cante para ele suas canções favoritas na sua língua. Te garanto: ele vai amar. E não vai mais esquecer.
Neste post, as seguintes obras foram citadas:
BREZINKA, C.; LECHNER, T. & STEPHAN, K. Der Fetus und der Lärm. Gynäkol Geburtshilfliche Rundsch, 37, 1997 (p.119-129).
MATIAS, G. F. A importância de estimulação auditiva durante o período pré e pós-natal. Porto Alegre: Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica, 1999.
VERRI, G. A gestante exposta ao ruído: Efeitos auditivos para o feto. Porto Alegre: Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica, 1999.